terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Um Lavrador do Douro


Barão de Forrester (1809-1861) - Cartoon de Santiagu


"Num país supostamente de cartógrafos, fez os primeiros mapas do Vale do Douro. Neste rio, em 1861, morreu afogado. Em 1885, tinha sido feito Barão por Pedro V. Com estes títulos, morreu português. Mais do que muito que cá nasceram, diz o "Archivo Pitoresco".
Os seus contemporâneos jujavam-no escocês, a par de muitos comerciantes instalados no Porto desde o século XVIII. Mas a verdade é que nasceu em HUll, Inglaterra, em 1809. Casou em 1836 com Elisa Cramp, que lhe deu seis filhos e morreu com o nascimento do último, em 1847.
Rico, culto, activo, inconformista e inteligente: tinha quase todas as características para desagradar. E assim foi. Criou inimigos por onde passou. Para os ingleses do Porto, era uma ovelha ranhosa.
Camilo Castelo Branco tratou-o de charlatão forasteiro e fôfo empantufado. Chega dizer, cruamente, que a sua morte foi " uma das mais notáveis vinganças que o  o rio Douro exercitou sobre um detractor dos seus vinhos"...
Já Ramalho Ortigão, que o conheceu, não tem dúvidas sobre a sua grandeza: " O Douro seria feliz se, em vez de eleger de quatro em quatro anos um deputado, pudesse de vinte em vinte anos nomear um proprietário como este"!
Joseph James chegou ao Porto em 1831. preparado para a aventura. Empregou-se na firma do ti. Pouco depois, era o cerco da cidade.À noitinha, atravessava o rio e ia zelar pelos seus armazéns de Gaia, nas mãos das tropas miguelistas. Foi testemunha do grande incêndio de trinta mil pipas da Companhia.
Correu o Douro a pé em todos os sentidos. Plantou vinhas, ergueu muros e construiu quintas. Vinte anos depois, mostrava os seus vinhos, com êxito, em grandes exposições.
(...)
No seu combate, que durou quase vinte anos, foi apoiado por Durienses. Não os lavradores, que confiavam mais na rotina, mas os notáveis. A Câmara da Régua, o Vaticano do vinho do Porto,, deu-lhe honras, estabelecendo-o " o mais decidido Protector do Douro, e n`esta consideração, o ha como seu Irmão Lavrador". Mas estes gestos não eram apoios à sua luta por um vinho natural: eram bem mais reforços contra Ingleses e Comerciantes do Porto, batalha para que os Durienses se dizem sempre prontos.
Deixou obra e nome. Criou lendas. Diz uma que morreu porque um cinto de oiro o impediu de nadar. Diz outra que, entre ele e a Ferreirinha, houve romance. Não há carta comprometedora, nem testemunho de criada. Mas há o mito. E as circunstâncias da sua morte, diante dela a flutuar no rio, pedem que haja romance.
Ao contrário dos seus pares (Cockburn, Sandeman...) cujas linhagens viveram dentro das suas firmas, Joseph James foi maior do que a sua empresa."

António Barreto  in jornal O Público 

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