quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Eternamente Douro-247

Foto;josé alfredo almeida

O meu Moledo-136

Foto:josé alfredo almeida

Vou à janela

Foto: josé alfredo almeida



fecho um livro
vou à janela
a noite é enorme


Carol Lebel

Escuta, Amor




"Escuta, Amor
Quando damos as mãos, somos um barco feito de oceano, a agitar-se sobre as ondas, mas ancorado ao oceano pelo próprio oceano. Pode estar toda a espécie de tempo, o céu pode estar limpo, verão e vozes de crianças, o céu pode segurar nuvens e chumbo, nevoeiro ou madrugada, pode ser de noite, mas, sempre que damos as mãos, transformamo-nos na mesma matéria do mundo. Se preferires uma imagem da terra, somos árvores velhas, os ramos a crescerem muito lentamente, a madeira viva, a seiva. Para as árvores, a terra faz todo o sentido. De certeza que as árvores acreditam que são feitas de terra.
Por isto e por mais do que isto, tu estás aí e eu, aqui, também estou aí. Existimos no mesmo sítio sem esforço. Aquilo que somos mistura-se. Os nossos corpos só podem ser vistos pelos nossos olhos. Os outros olham para os nossos corpos com a mesma falta de verdade com que os espelhos nos reflectem. Tu és aquilo que sei sobre a ternura. Tu és tudo aquilo que sei. Mesmo quando não estavas lá, mesmo quando eu não estava lá, aprendíamos o suficiente para o instante em que nos encontrámos.
Aquilo que existe dentro de mim e dentro de ti, existe também à nossa volta quando estamos juntos. E agora estamos sempre juntos. O meu rosto e o teu rosto, fotografados imperfeitamente, são moldados pelas noites metafóricas e pelas manhãs metafóricas. Talvez outras pessoas chamem entendimento a essa certeza, mas eu e tu não sabemos se existem outras pessoas no mundo. Eu e tu declarámos o fim de todas as fronteiras e inseparámo-nos. Agora, somos uma única rocha, uma única montanha, somos uma gota que cai eternamente do céu, somos um fruto, somos uma casa, um mundo completo. Existem guerras dentro do nosso corpo, existem séculos e dinastias, existe toda uma história que pode ser contada sob múltiplas perspectivas, analisada e narrada em volumes de bibliotecas infinitas. Existem expedições arqueológicas dentro do nosso corpo, procuram e encontram restos de civilizações antigas, pirâmides de faraós, cidades inteiras cobertas pela lava de vulcões extintos. Existem aviões que levantam voo e aterram nos aeroportos interiores do nosso corpo, populações que emigram, êxodos de multidões famintas. E existem momentos despercebidos, uma criança que nasce, um velho que morre. Dentro de nós, existe tudo aquilo que existe em simultâneo em todas as partes.
Questiono os gestos mais simples, escrever este texto, tentar dizer aquilo que foge às palavras e que, no entanto, precisa delas para existir com a forma de palavras. Mas eu questiono, pergunto-me, será que são necessárias as palavras? Eu sei que entendes o que não sei dizer. Repito: eu sei que entendes o que não sei dizer. Essa certeza é feita de vento. Eu e tu somos esse vento. Não apenas um pedaço do vento dentro do vento, somos o vento todo. 
Escuta, 
ouve. 
Amor. 
Amor."



José Luís Peixoto

terça-feira, 28 de novembro de 2017

Dia Perdido?





Só para o frio equipado,
sem boné nem cartucheira,
na neve é fotografado
de  espingarda à maneira.

Para à arma uso dar,
pensa ele com bonomia,
os caracóis vou matar
nos quintais da freguesia.

O cão irá a seu lado
como fiel companheiro,
mas ficará desolado
que da perdiz esperava o cheiro...


Vila Real, 28 de novembro
M. Hercília Agarez

O meu Moledo-135

Foto:josé alfredo almeida

Barco na paisagem-352

Foto:josé alfredo almeida

Eternamente Douro-246

Foto:josé alfredo almeida

domingo, 26 de novembro de 2017

O meu Moledo-132

Foto:josé alfredo almeida

Voltar pelo coração






Há tanto para descobrir.
Tanto para ver e sentir.

Quantas cidades, caminhos percorri
em quantos rostos me confundi,
quantos corpos amei, afinal à procura de ti.

Por vezes é preciso partir.
baralhar a vida, correr alguns riscos.
Para saber.
Se o amor que te tinha chegava para uma vida,
se era o que eu queria...

Agora, preciso de voltar.

De reaprender o caminho onde as madrugadas dormem límpidas sob brancos lençóis, como amantes de um rio.
E o entardecer tem sabor a figos, a pão e a mosto.

A tua voz.
A dizer o quanto me amavas.

Por vezes é preciso partir para voltar.



Ana de Melo

Eternamente Douro-245

Foto: josé alfredo almeida

Pontes da Régua-1134

Foto:josé alfredo almeida

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Ó oliveira da Régua...

Foto:josé alfredo almeida


Majestosa. Imponente. Seráfica. Narcisista. Templo de colunas semi-geminadas. Impõe a sua cúpula gigantesca, feita de folhas em miniatura, numa paisagem em que dominam, vistas dali, umas vinhazinhas decrépitas, de folhas encarquilhadas, velhas, moribundas.

Nunca a terão tesourado, como às suas colegas sem pergaminhos, para facilitar a apanha da azeitona. A sua missão é decorativa, não produtora. Os seus frutos, mimeticamente confundidos com a  folhagem (mais verde, menos verde), são  tão inúteis como as pedrinhas das margens do rio.

E troça dos longes, olha a cidade como se fosse a Régua dos Pequeninos. As pontes, os  montes, o rio parecem-lhe desenhos infantis. E o seu ego incha desmesuradamente ao ver nela fixas objectivas fotográficas num momento em que os passantes só associam a beleza da região duriense ao colorido policromo dos vinhedos.


Vila Rea, 22 de Novembro
M. Hercília Agarez

Eternamente Douro-241

Foto: josé alfredo almeida

Nunca se está só num lugar

Foto:josé alfredo almeida




Venho a este sítio sempre que posso.
-Costumavas vir sozinha?
-Nunca se está só num lugar.



Cesare Pavese

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Janela de Outono

Foto: josé alfedo almeida




Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.


Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.


Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]



Fernando Pessoa

domingo, 19 de novembro de 2017

Caixinha de segredos






A frescura dos sorrisos trocados entre as meninas, os seus vestidos decentemente vaporosos, contrastam com a aridez do espaço escolhido para o encontro. Terão ido para ali a fim de que ninguém ouvisse os seus segredos, as suas confissões, a sua troca de desabafos?

Naquela idade, naquele tempo de dias transbordantes de lazeres, sem responsabilidades familiares nem laborais, de que haveriam elas de falar? Discutiriam livros lidos? Trocariam truques culinários? Falariam de arte, de ciência? Os seus olhos reluzentes traduzem um entusiasmo jovial que faz adivinhar andarem"mouros na costa"! O amor as faz sorrir, partilhar projectos de vida, expectativas, sonhos. Vêem o futuro como uma vivência de emoções partilhadas, de ternuras e mimos, de viagens e espectáculos, de roupas dignas de princesas. Oxalá não tenha a vida manchado o manto colorido que a juventude bem nascida mentalmente tecia.

Entretanto, nas respectivas casas, "aquelas senhoras que só havia dantes" de que fala António Gedeão no poema "Mãezinha" esmeram-se em rendas e bordados, matérias em que as jovens são analfabetas.


Vila Real, 19 de Novembro 
M. Hercília Agarez   

Eternamente Douro-239

Foto: josé alfredo almeida

Eternamente Douro-238

Foto:josé alfredo almeida

Outono à pesca

Foto: josé alfredo almeida

Tanta cor

Foto:josé alfredo almeida



(...)
Nunca vi tanta cor...
... Tão colorida!

(...)



Miguel Torga

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

História do Douro

























Autor:  António José Borges Mesquita Montes
Editora: Chiado Editora ( Novembro de 2017) 



Sobre as duas obras:

"A Casa do Douro, obra-prima gerada em 1932 pelos Paladinos chefiados então por Antão de Carvalho, apresenta, no seu historial de décadas, situações que bem demonstram, não apenas a magnanimidade do Douro, mas ainda a força hercúlea dos seus viticultores; não apenas no amanho das suas parcelas de vinha, mas também na forma como sempre defenderam a sua Casa que também tudo fez, ao longo dos tempos, para a sobrevivência dos durienses.
Anos e anos sem conta, como se pode constatar nos mapas que aqui se publicam, em que o normal funcionamento do mercado dos vinhos não funcionou, lançando a miséria entre os produtores e obrigando a Casa do Douro a ciclópicas acções de intervenção no mercado, quer dos vinhos de pasto, quer mesmo dos generosos. 
E foram destilarias sem conta para “queimar” todos os anos os vinhos que o mercado não absorvia e produzir a aguardente necessária para a beneficiação dos generosos que haviam de vir... 
E foram armazéns que a Casa do Douro ia construindo para guardar os vinhos generosos que o comércio, quantas vezes, não comprava ao produtor por via de crises que surgiam no mercado dos vinhos, ou ainda de “políticas” que o comércio decidira, por si, impor ao Douro... 
E foram ainda as Adegas Cooperativas que a Casa do Douro ajudou a nascer a partir de 1950 com um contributo não reembolsável de 20% do investimento inicial; 24 foram elas e bem contribuíram para o desenvolvimento tecnológico da vinificação das uvas, para o equilíbrio dos preços ao produtor e para o surgimento de novas marcas no mercado dos vinhos engarrafados. 
Casa do Douro, uma organização da Lavoura, invejada por muitos, nomeadamente por muitas outras regiões vitícolas do Mundo que cobiçavam, também elas, poderem ter coisa igual!
Em 1990 estávamos na sexta década de existência da Casa do Douro. 
O passado, por si, era bastante para que ela usufruísse de todo o respeito - e admiração até – de quem nos governava. Mas, infelizmente, da inveja de muitos outros. 
A Casa do Douro, única “organização corporativa” que passou incólume as consequências da revolução de Abril, continuava a desempenhar, no Douro e junto dos viticultores, as suas funções de equilíbrio da Produção. 
Mesmo quando, tendo surgido tal oportunidade, tomou a decisão de integrar parte do capital da Real Companhia Velha, empresa centenária dedicada à comercialização do Vinho do Porto. 
Que não tinha em vista apenas o usufruto de interesses comerciais, mas, exclusivamente, abrir canais de comercialização directa aos inúmeros viticultores que, já nessa altura, haviam decidido comercializar directamente e sob marcas próprias a sua produção. 
O projecto era aliciante, questão era que os próprios produtores acreditassem nele. 
Foram mais fortes aqueles que, receosos das boas perspectivas daí advenientes que se adivinhavam, tudo fizeram para que tal projecto não fosse em frente; e não foi mesmo. 
Decorrente deste desaire, surgiu na “classe política” de então a oportunidade de finalmente poder pôr fim “ao reinado da Casa do Douro” que já vinha de há décadas. 
À classe política que integrava o Governo de então não foi difícil encontrar argumentos a começar no endividamento da Instituição. 
E ser bem o pensou, de imediato passou ao ataque, exigindo a regularização do passivo da Casa do Douro junto das instituições bancárias nas quais o Estado intervinha como avalista. Questão que até teria sido muito mais fácil de conseguir se o Estado, nessa altura, tivesse assumido, também, a dívida que ainda hoje mantém para com a Casa do Douro, conforme conclusão de estudo então feito e em que ela está perfeitamente especificada e quantificada. 
Mais uma vez aqui se cumpriu o velho ditado: “...olha para o que eu fiz, mas não olhes para o que eu faço...”. 
Aqui, e assim, se iniciou, como tantos desejavam, o descalabro da Casa do Douro, obra dos Paladinos que ao Douro, aos seus Viticultores e ao País prestou sempre serviços de valor incomensurável." 

Sobre o autor:

"António José Borges Mesquita Montes – nasceu na freguesia de Fontelas do concelho de Peso da Régua em 30.03.1939. Fez o curso de Engenheiro Técnico Agrário pela Escola de Coimbra e obteve o tirocínio em Viticultura e Enologia com a classificação de 19 valores. Foi Técnico da Direcção Geral dos Serviços Agrícolas, desempenhando funções em Viana do Castelo entre 1961 e 1965, data em que passou a Técnico da Companhia União fabril, com funções nos distritos de Vila Real e Bragança entre 1965 e 1972. Nessa altura passou a Gerente da Empresa Agrícola da Serra de Leomil, até 1974. Desempenhou depois funções docentes no Curso de Agricultura da Escola Agrícola do Rodo – Peso da Régua. Desde 1.6.1975 desempenhou funções na Comissão de Gestão da Casa do Douro. A partir de 1976 foi eleito sucessivamente para os diversos órgãos directivos da Casa do Douro de que foi presidente de 1987 a 1998. De 1967 a 1994 foi Presidente da Cooperativa Vitivinícola do Peso da Régua – Caves Vale do Rodo, acumulando funções em órgão directivos da União das Adegas Cooperativas do Douro e da Subvidouro – Centro de Aproveitamento de subprodutos do Douro. Foi membro da Comissão Nacional do Office International de la VigneetduVin com sede em Paris; e da Union Mondial dês Alchools com sede em Paris. É Mestre Patrão Principal da Confraria dos Enófilos do Douro e membros de diversas Confrarias Vínicas nacionais e estrangeiras."