terça-feira, 31 de março de 2015

Reconhecer o Douro

Foto: Noel de Magalhães

À beira da água

Foto: josé alfredo almeida



Estive sempre sentado nesta pedra 
escutando, por assim dizer, o silêncio. 
Ou no lago cair um fiozinho de água. 
O lago é o tanque daquela idade 
em que não tinha o coração 
magoado. (Porque o amor, perdoa dizê-lo, 
dói tanto! Todo o amor. Até o nosso, 
tão feito de privação.) Estou onde 
sempre estive: à beira de ser água. 
Envelhecendo no rumor da bica 
por onde corre apenas o silêncio.


Eugénio de Andrade

Pontes da Régua-92


Foto:josé alfredo almeida

Ciclo da Vinha-8

Foto: josé alfredo almeida

segunda-feira, 30 de março de 2015

Os Desenhos de Ana Margarida -4

Desenho de Ana Margarida Almeida



Vem toda nua 
ou, se o não consentir o teu pudor, 
vestida de vermelho.

Teus tules brancos, 
o azul, que desmaia, 
de tuas sedas finas, 
guarda-os p’ra outros dias.

P’ra quando, Amor!, teu ventre, já redondo, 
merecer a pureza do azul...


Sebastião da Gama

Anda comigo ver...

Foto: josé alfredo almeida


É a roupa a corar
É o musgo no muro
A andorinha a ensaiar
O seu voo futuro


São as águas de Março
O Inverno acabado
São os idos de Março
É preciso cuidado


Licinia Quitério

Pontes da Régua-92

Foto:josé alfredo almeida

Um lugar onde (não) entrei

A Régua, 1880


Encontro-me à mesa da minha secretária, num entardecer outonal com a luz a resplendecer nas águas do rio e nos vinhedos que serpenteiam o vale Abraão, absorvido na leitura de um livro que, de um momento para o outro, me leva às vindimas no meu Douro. Enquanto ouço, lá no meio dos socalcos coloridos, os cantares das vindimadeiras e os sons de uma gaita-de-beiços, um harmónio, os ferrinhos e os bombos que acompanham o pisar das uvas pelos homens, deixo-me viajar no tempo em direcção ao passado.
Acabo de chegar à vila da Régua dos finais do século dezanove. O comboio que me trouxe terminou aqui a sua marcha, apenas com um ligeiro atraso relativamente ao seu horário. Estou na estação, que esconde muita da sua beleza arquitectónica nos ramos dos frondosos plátanos. Da sua porta principal, começa a sentir-se o bulício de pessoas e dos transportes na estrada nacional que lhe passa em frente. Sinto odores de vinho fino que se misturam com perfumes de flores silvestres. As diligências da viúva Vilela, empresária e benemérita, estão de saída para outras paragens.
A vila está a crescer e o comércio prospera, mas é a sua beleza que atrai a atenção do meu olhar e me deixa, por breves instantes, extasiado pela luz e pela intensidade das cores de uma paisagem fascinante que alastra até às margens do rio. Sou despertado por uma velha rebuçadeira de bata branca que vende pacotinhos de uns rebuçados embrulhados em papel. Compro-lhe dois pacotinhos e delicio-me com o aroma de flor de laranjeira de um doce rebuçado da Régua.
Olho as horas no relógio da estação, está muito calor, decido passear-me pela Rua da Bandeira, o coração da vila, onde se faz todo o comércio de retalho, as casas exportadoras guardam o vinho e as aguardentes, onde ficam as hospedarias e as pensões e se encontram as figuras mais respeitáveis da terra. Depois de fazer uma ligeira refeição numa hospedaria mais recomendada, quero visitar a Loja do Zé Pinto, progressista ferrenho, e aí comprar a última edição do bi-semanário O Douro. O jornal interessa-se por divulgar os assuntos da lavoura, do comércio dos vinhos e a gestão da câmara do regenerador Dr. Júlio Vasques. À entrada desta loja, onde se vende um pouco de tudo, deixo o meu olhar penetrar numa sala para aí rever figuras ilustres numa roda de cavaqueira e que, agora, me parecem almas retiradas das profundezas da Eternidade ou de um outro mundo. Na verdade, não os conheço nem eles me conhecerão a mim, mas nutro por eles uma indisfarçável admiração, simpatia e respeito pelo que fizeram no seu tempo. Se eu pudesse falar com alguns deles, seria com o poeta Camilo Guedes Castelo Branco, que continua a usar a sua farda de soldado da paz.
Retomo a minha caminhada e, de uma viela que circunda o Largo do Cruzeiro, vejo passar o senhor Afonso Soares, de barbas brancas e olhos luminosos. Deve ter acabado o seu repasto, porque fuma com redobrado prazer. Disseram-me que é um apreciador de sável, um saboroso peixe que ainda se pesca no rio Douro. Bem gostava de o ter convidado para provar comigo esta deliciosa especialidade gastronómica, mas o senhor Soares é um artista diletante, jornalista, escritor, erudito e pintor. Quase que desconfio que não pode dissipar nenhum do seu precioso tempo com um estranho que lhe apareça assim de frente. Tem mesmo muito que fazer e deve estar preocupado com o futuro da corporação de bombeiros, onde acabou de ser escolhido para Comandante.
Desço a ruela das Vareiras, com as tabernas que vendem os vinhos mais baratos e apreciados pelo povo e onde crescem negócios em que o sal e a sardinha salgada de barricas são as principais mercadorias. Ao fundo da rua sobressai o areal extenso por onde corre o rio e voam vertiginosamente as últimas andorinhas, anunciando que estão de partida. Um barco rabelo de vela içada, carregado com cinquenta pipas de vinho da feitoria, produzido pela firma Martinez e Gassiot, solta as amarras de um movimentado cais fluvial.
Como se faz tarde, aproximo-me da Rua Nova para me dirigir à Casa da Companhia. No seu átrio, juntam-se lavradores, comerciantes, corretores e comissários das casas inglesas. Enquanto uns discutem os preços da pipa de vinho da vindima, outros exibem amostras de colheitas antigas. O preço da pipa ronda os 25.000 mil réis, e os viticultores estão insatisfeitos. Diante de mim, tenho os senhores Francisco Ferreira e António Claro, fiéis empregados da Casa A.A. Ferreira, Scrs. Estou surpreendido: os lavradores, numa veneração digna de deuses, saúdam-nos com vénias e mesuras. Gostava de cumprimentar a D. Antónia, a Ferreirinha, que deve estar pela Quinta das Nogueiras, e agradecer-lhe a generosidade para com a associação de bombeiros, que, como primeira sócia contribuinte, muito ajudou nos primeiros anos de existência.
Quem eu vinha procurar, um tal comissário da casa Sandeman, não encontrei. Ali perto, está a relojoaria de Adolfo Pauman, um velho actor galego que deixou as artes cénicas para ser bombeiro voluntário e se dedicar ao comércio reguense. A porta da loja está encerrada, pelo que decido entrar na Botica do Anastácio, outro memorável ponto de tertúlia. Ao balcão, está um moço que avia umas receitas de pomadas. Pergunto-lhe pelo paradeiro do senhor António Roberto Pinto. Depois de sair o cliente, diz-me que devo encontrá-lo na casa da Real Associação dos Bombeiros, no Largo da Chafarica, onde ao fim da tarde costuma ir jogar dominó, quino e frequentar a sala de leitura. Meto as pernas ao caminho em direcção à Rua da Boavista e, em pouco tempo, chego ao quartel dos bombeiros voluntários, instalado numa casa antiga, o rés-do-chão para arrumar as bombas e o primeiro andar para reuniões e encontros de lazer.
É domingo, e as badaladas do sino da capela do Senhor do Cruzeiro dão as seis horas da tarde. Alguns associados, mais habituados a frequentarem a sala de jogos e a casa de leitura, apressam-se a entrar no quartel. Reconheço o senhor António da Silva Correia, solicitador, e o Dr. Júlio Manso Preto, jurisconsulto e publicista que exerce o foro na vila. Ninguém sabe onde nasceu, mas aqui se radicou e fez família. Intriga-me que deste autor ninguém tenha dado atenção ao folheto que publicou em 1864 com o sugestivo título Duas Palavras Acerca da Régua e Arredores. Não o li, mas o seu autor faz aí um magistral retrato poético desta terra, então com poucas ruas, algumas com bons edifícios elegantemente construídos, notável pelo seu comércio de vinhos. Ele, que adoptou esta terra para viver, viu beleza nas colinas tapeteadas de vinha e polvilhadas de casario branco, um encanto para o olhar, donde se  avistava um rio forte, sem igual, e os enormes  sabugueiros em flor.
Atravessa o Largo da Chafarica, vindo do seu escritório, um jovem que começara a advogar como sucesso. Apaixonado pelos ideais republicanos, vai dedicar-se com afinco a resolver as mais problemáticas das questões do Douro. O causídico chama-se Antão de Carvalho e está a iniciar o brilhante futuro que o levará ao cargo de Ministro da Agricultura, logo após a instauração da República, e depois a ser o mais dinâmico dos paladinos do Douro.
Aproxima-se o abastado comerciante Joaquim Sousa Pinto, fardado de bombeiro, acompanhado pelo Comandante Afonso Soares e pelo presidente da direcção, Alberto Pereira Rolla, sendo saudados com continência por um piquete de voluntários. Param diante de mim e, como não me reconhecem familiar ao meio, cumprimentam-me com um afável “Boa tarde, meu caro amigo”. De imediato, o Comandante Afonso Soares, que traz na mão esquerda um manuscrito do livro que irá publicar, os Apontamentos para a História da Vila e Concelho, abeira-se de mim e pergunta-me se me pode ser útil. Digo que sim, que procuro o senhor António Roberto Pinto, comissário da casa comercial Sandeman, a quem precisava de dar umas palavras...! Avisa-me que deve estar a chegar para entregar um donativo da casa Sandeman para ajudar a missão dos bombeiros. Ainda o ouço exclamar: “Bem precisamos de dinheiro….”. Entretanto, pergunta-me se me fiz associado contribuinte. Não sei como lhe responder, mas prometo ao Senhor Soares que, mais tarde, aparecerei para me inscrever como sócio e é o que faço….um século depois.
As badaladas do sino do Cruzeiro voltam a ouvir-se dolentemente e fazem-me acordar de um sono profundo, aconchegado pelo calor outonal. Tenho aberto o livro de actas dos mandatos das primeiras direcções dos bombeiros da Régua. Cá está o desconhecido comissário que não tive a sorte de encontrar na minha viagem ao passado. Uma acta da reunião extraordinária da Direcção dos Bombeiros datada de 1893 confirma-me que, nesse dia, esteve presente o “Sr. António Roberto Pinto comissário da casa ingleza Sandeman, tendo por este entregue á hora desta sessão  a quantia de 25.00 mil réis, que a mesma offerece para os fundos da Associação. Deliberou-se por unanimidade agradecer a oferta”.
A Sandeman, como casa comercial, morreu; aquele mítico nome pertence agora a outra empresa de vinhos, a Sogrape. Com ela morreram também os influentes comissários das casas inglesas, sobre os quais o escritor João de Araújo Correia escreveu o seguinte: “Governam-se melhor que o lavrador e quase tão bem como o comerciante. Estabelecem entre um e outro uma risca de união perfeita de metal precioso. Ser comissário é ser alguém. Ser comissário de casa inglesa é porventura ser mais do que alguém. (…) Ser empregado de ingleses, no Douro, é ser gente estremada – ainda que o emprego se exerça numa adega com caneco à cabeça. Se o emprego é porém de vulto, se representa confiança e espelha a bizarria inglesa, o empregado chama-se comissário e é um lorde. É um lorde entre lavradores preocupados com colheitas e com vendas”.
Já cá não estão estes lordes da sociedade duriense para defenderem o seu bom nome. Morreram todos. Perdura o nome do Sr. António Roberto Pinto, que, apesar de nada sabermos acerca dele, deixou uma fama de benfeitor dos bombeiros da Régua.
Devia acabar aqui esta pequena história. Mas, o mais certo, é ela continuar para acrescentar o exemplo da casa Symington - sócia contribuinte nº 578 – que assim concede o seu apoio a uma instituição humanitária que tem como seu ideal fazer o bem comum.


José Alfredo Almeida

(Re)Conhecer a Régua-210





                                Régua: anos 30 (?): aqui a rua da Ferreirinha

domingo, 29 de março de 2015

Certezas

Foto: josé alfredo almeida



O outro sabia. 
Tinha uma certeza. 
Sou eterno, dizia.

Eu não tenho nada. 
Amei o desejo 
com o corpo todo.


Ah, tapai-me depressa. 
A terra me basta. 
Ou o lodo.

Eugénio de Andrade

Perto do mar

Foto: josé alfredo almeida




“O maior e o mais velho amor, é o amor pela 
vida.”


―Plutarco






Tudo era claro: 
céu, lábios, areias. 
O mar estava perto, 
fremente de espumas. 
Corpos ou ondas: 
iam, vinham, iam, 
dóceis, leves – só 
ritmo e brancura. 
Felizes, cantam; 
serenos, dormem; 
despertos, amam, 
exaltam o silêncio. 
Tudo era claro, 
jovem, alado. 
O mar estava perto. 
Puríssimo. Doirado. 

eugénio de andrade

Caminhos

Foto:  josé alfredo almeida

Para namorar

Foto: josé alfredo almeida


Se fosses mulher, em vez de seres árvore,
e eu fosse um homem, em vez de ser rio,
seria igual.
Os teus cabelos espalhados no meu peito,
O teu corpo nu.
Imaculada.
Num banho de luz.

Ana de Melo

Pontes da Régua-91

Foto: josé alfredo almeida

sábado, 28 de março de 2015

APELO

Em busca das memórias perdidas das Caldas do Moledo








A Tertúlia João de Araújo Correia vai organizar, em breve, um roteiro em torno de um dos lugares mais bonitos da região - as Caldas do Moledo. Esse espaço mereceu ao escritor inúmeras crónicas desde a década de 50 até aos anos 80. 

Em PÁTRIA PEQUENA, numa crónica sobre este assunto ele diz: "Houve tempo em que as Caldas do Moledo, a dois passos da Régua, foram em cada Verão sala de visitas da Régua. (...). 

E questiona-se sobre as razões que as levaram à situação de abandono a que foram votadas. 

O tema continua cheio de actualidade. 

A Tertúlia gostaria muito de ilustrar com imagens esse conjunto de textos que João de Araújo Correia produziu e montar, se possível, uma exposição de fotografia (actuais e do passado) sobre o assunto.

Daí o apelo: possuem, ou sabem quem possui, fotos antigas, postais ilustrados, cartazes e outros documentos que possam ser digitalizados e reproduzidos? Em caso afirmativo, contactem-nos, por favor, através de mensagem no facebook ou através do e.mail tertulia_jac@sapo.pt


Beleza pura

Foto: josé alfredo almeida


Do que a vida ê capaz!
A força dum alento verdadeiro!
O que um dedal de seiva faz
A rasgar o seu negro cativeiro !

Ser!
Parece uma renúncia que ali vai,
— E é um carvalho a nascer
Da bolota que cai!

Miguel Torga

Aquela casa

Foto: josé alfredo almeida



Só porque tu existes.
Com o teu cheiro,
os teus passos leves.

As janelas são os olhos por onde vemos o nosso mundo.

Ora agreste, ora doce.
Calado como tu,
ou cheio de cores rubras e violeta,
também como tu.
O correr do rio, que confundo com o som do teu riso, e este céu imenso, como um manto sobre nós...

Esta casa onde os teus olhos poisam de mansinho
quando acordas e assim, se acende como fogo a crepitar de vida e me consome em ternura...

Aquela casa, dirão:
-É dali que Deus espreita o mundo!

E eu sei, que as janelas de Deus, são os teus olhos.

ana de melo

Quero ver

Foto: josé alfredo almeida

Quero recordar




sexta-feira, 27 de março de 2015

(Re)Conhecer a Régua-209


Res nullius


Foto: josé alfredo almeida


Desliza marulhando
Pelo rio barrento e sujo,
Na pedra nasce a flor.

Natália Vale

Horas de chegar...

Foto: josé alfredo almeida

Tempo — definição da angústia.
Pudesse ao menos eu agrilhoar-te
Ao coração pulsátil dum poema!
Era o devir eterno em harmonia.
Mas foges das vogais, como a frescura
Da tinta com que escrevo.
Fica apenas a tua negra sombra:
— O passado,
Amargura maior, fotografada.

Tempo...
E não haver nada,
Ninguém,
Uma alma penada
Que estrangule a ampulheta duma vez!

Que realize o crime e a perfeição
De cortar aquele fio movediço
De areia
Que nenhum tecelão
É capaz de tecer na sua teia!

Miguel Torga

Azinheira

Foto: josé alfredo almeida


Paz das montanhas, meu alívio certo.

O girassol do mundo, aberto,

E o coração a vê-lo, sossegado.

Fresco e purificado,

O ar que se respira.

Os acordes da lira

Audíveis no silêncio do cenário.

A bem-aventurança sem mentira:

Asas nos pés e o céu desnecessário.

Miguel Torga

Até ao céu

Foto: josé alfredo almeida


O homem olhou a árvore e pensou:
esta árvore existe, não tenho qualquer dúvida,
mas será que tem consciência de si?
Para sua surpresa, a árvore respondeu-lhe:
tu tens consciência de ti, não duvido,
mas será que existes mesmo?

Luís Ene

quinta-feira, 26 de março de 2015

Lavar os cabelos no rio

Foto:josé alfredo almeida


Ao contrário de ti 
não tenho ciúmes. 

Vem com um homem 
às costas, 
vem com cem homens nos teus cabelos, 
vem com mil homens entre os seios e os pés, 
vem como um rio 
cheio de afogados 
que encontra o mar furioso, 
a espuma eterna, o tempo. 

Trá-los todos 
até onde te espero: 
estaremos sempre sozinhos, 
estaremos sempre tu e eu 
sozinhos na terra 
para começar a vida. 

Pablo Neruda

Luz que fica

Foto: josé alfredo almeida



Fico em silêncio para melhor te ouvir
Fecho os olhos para melhor te ver
Estou só mas sinto-me acompanhado

Luís Ene

Flores

Foto: josé alfredo almeida

Papoila

Foto: josé alfredo almeida

quarta-feira, 25 de março de 2015

Pontes da Régua-90

Foto: josé alfredo almeida

Pinhão antigo

~

Procurando a luz para ver as sombras

Foto: josé alfredo almeida

 Em S. Leonardo De Galafura - Peso da Régua, Setembro/2014



Da varanda do quarto
viam-se
em vez das aliterações
o vale

e os pinheiros bravos
a subir
o monte. Acordava-se assim
a ver as coisas

concretas. Como se
afinal
além da literatura houvesse

mundo: casas;
pessoas; pássaros que
voavam mesmo.

José Carlos Barros

Companhias

Foto: josé alfredo almeida

Ciclo da vinha-7

Foto: josé alfredo almeida

Chão das sombras

Foto: josé alfredo almeida




Porque a memória
recupera sempre o que não temos
ou já não podemos ter.

jose carlos barros

terça-feira, 24 de março de 2015

Poeta Obscuro

Foto: Alfredo Cunha
                           
                              1930-2015

                           "Li algures que os gregos antigos não escreviam necrológios,
                           quando alguém morria perguntavam apenas:
                           tinha paixão?"


“Só morremos de nós mesmos.” 

Herberto Helder, Servidões


Montes ermos

Foto: jsé alfredo almeida



Nenhuma estrela nos guia
no mundo, nenhuma palavra
dos livros, nenhum fio
por entre o labirinto
das horas. Somos o caminho
que fazemos:
erros sucessivos,
perdas, muros erguidos
contra o rumo
dos astros, o orgulho,
as primeiras lágrimas,
a ilusão do amor.


José Carlos Barros

Preguiça


Foto: josé alfredo almeida

Decifrar o rio-3

Foto:  josé alfredo almeida

Decifrar o rio-2

Foto: josé alfredo almeida

Pontes da Régua-89


Foto: josé alfredo almeida

segunda-feira, 23 de março de 2015

Primavera

Foto: josé alfredo almeida


Onde se diz espiga
leia-se narciso.
Ou leia-se jacinto.
Ou leia-se outra flor.
Que pode ser a mesma.

As flores
são formas
de que a pintura se serve
para disfarçar
a natureza. Por isso
é que
no perfil
duma flor
está também pintado
o seu perfume.

Albano Martins

MEZIO-3

Foto: josé alfredo almeida



És precária e veloz, Felicidade.
Custas a vir e, quando vens, não te demoras.
Foste tu que ensinaste aos homens que havia tempo,
e, para te medir, se inventaram as horas.


Felicidade, és coisa estranha e dolorosa:
Fizeste para sempre a vida ficar triste:
Porque um dia se vê que as horas todas passam,
e um tempo despovoado e profundo, persiste.

Cecília Meireles

Pontes da Régua-88


Foto: josé alfredo almeida

Decifrar o rio

Foto: josé alfredo almeida

sábado, 21 de março de 2015

Lembrar M. Nogueira Borges






Acreditem-me ou não, o que escrevi SINTO-O. Sabes, a vida é feita por NÓS, "OS SIMPLES", OS QUE ANDAM AQUI COM UMA LUZ NO CORAÇÃO.  SÓ TEMOS QUE FAZER UMA "COISA": AGRADECER A QUEM NOS DEU ESSA FELICIDADE!



M. Coutinho Nogueira Borges em 7 de Fevereiro de 2012

Fazer fotografias

Foto: josé alfredo almeida


“Fotografar, é colocar na mesma linha, a cabeça, o olho e o coração.”


Henri Cartier-Bresson


O Olhar de Deus

Foto: josé alfredo almeida

Uma família reguense




    Uma família de origem social modesta, na  Régua dos 40/50

sexta-feira, 20 de março de 2015

O nosso eclipse

Foto: josé alfredo almeida



  "Olhemos hoje de manhã para o Sol, através das nuvens, para perceber os eclipses totais são relativos e passageiros. Assim acontece também com o declínio e a decadência de Portugal e dos Portugueses: o mal é de longa duração, com tão curta aparência, que acaba por ser como começou: como a nossa condição."


Miguel Esteves Cardoso in jornal "O Público" de 20 de Março de 2015

Lágrima

Foto: josé alfredo almeida




Todos os que vivemos em regiões de vinho sabemos que as vinhas montam para nós, com grande generosidade, um doce espectáculo de cores e formas: o final rubicundo e dourado do Verão, os ramos e troncos pardos com que o Inverno atinge o seu pico e os botões de verde esperança que anunciam a Primavera.

No Inverno, sob a chuva miúda e constante, as vinhas, tanto aquelas que são aramadas como sobretudo as outras, que crescem retorcidas mais junto à terra, apertam-nos a alma e apavoram-nos o espírito: parecem ossos de mortos de onde se desprendem cabelos longos, esparsos e retorcidos. Os ramos, ainda não podados e de há muito desprovidos de folhas ou frutos, tremem sob o vento e a chuva sem qualquer alegria. É talvez por isso que os cultivadores gostam de chegar às vinhas com as suas tesouras e serrotes. Num instante, os terrenos lamacentos e devastados de folhas, ficam a parecer bem, com os ramos podados e limpos, nítidos como a vontade do corte. É nessa altura que, ao ver as lágrimas felizes da chuva a caírem lentamente do ramo onde a Primavera fará crescer ramos, folhas, gavinhas, cachos, é nessa altura que nós próprios, abrigando-nos ainda da chuva e do frio, queremos que o tempo se apresse, o sol se mova no céu, os pássaros cheguem de longe, e a vinha se cubra com o verde da vida.  

Paulo Varela Gomes