sexta-feira, 31 de maio de 2019

Maias

Foto: josé alfredo almeida



Lá, bem sobre a estrada,
a casa entre flores onde
não entrarei nunca.




Alexei Bueno

quarta-feira, 29 de maio de 2019

Languidamente

Foto:josé alfredo almeida


Mais vale boa fuga que má espera

(Pensamento francês)


    Não é esta a residência das ramadas em fuga a cepas velhas e revelhas, ásperas ao tacto, tristes ao olhar. Espreguiçando-se, languidamente, sonham outros voos. Desafiam o destino sem medo de represálias.
    Acompanharam, atentas e bisbilhoteiras, a construção deste gradeamento protector de entradas indesejadas. Na espera, foram arquitectando a aventura. Sem despedidas piegas, chegaram e “floriram” em modernidade com gente dentro, convivas de outos mundos, de outros status, de outras palavras. Ou seja, mania das grandezas!
   Deste terraço contempla-se o Douro dos longes, dos trabalha-quem-precisa, dos suores secos por sóis compreensivos, dos turistas do magnifique, do wonderful, do wunderbar.
    Mesmo que estres ramos subtis tenham, com a façanha, sacrificado a produtividade à estética, decerto andarão nas palminhas dos felizes contemplados até ao momento de lhes oferecerem, como paga da hospitalidade, bouquets de folhas multicolores.


M. Hercília Agarez
Vila Real, 29 de Maio 

terça-feira, 28 de maio de 2019

Gosto de ser só

Foto:josé alfredo almeida




Incógnito passaroco
aventura-se em alturas:
gosto de ser só.


M. Hercília Agarez

segunda-feira, 27 de maio de 2019

Tríptico de aguarelas


Foto: josé alfredo almeida


    Para além do tríptico de aguarelas, de dimensões generosas, qualquer decoração seria, neste espaço, redundante.
    Em tempos de ditames minimalistas, o bom gosto marca-se, aqui, pelas ausências: de nacos de paisagem duriense estafadamente emoldurados, de elementos icónicos da região vinícola, em desuso, de memórias da passagem de comedores ilustres.
    A beleza é a da simplicidade, do requinte, do bom gosto contido, dos pormenores apreciados por clientes daqueles que “sabem estar” …
    O branco dominante é uma inerência sóbria. Alinhados, talheres e copos, e pratos (com guardanapo a cavalo…) dispensam solitários em flor que por vezes agradam e sempre estorvam. As argolas, já não de prata, sugerem um passado (e algum presente) de quintas senhoriais onde eram usadas, em ritual de bem receber, como bilhete de identidade de hóspedes vindos para ficar uns diazitos vindimeiros. E assim se resolve, airosamente, a questão levantada pela etiqueta: onde colocar os ditos limpa-beiços? À esquerda, como os franceses, ou à direita, segundo a nossa tradição?
    Quando a luminosidade solar “se esvai ao sol poente / como canção dolente…” (fado de Coimbra), entram em cena os candeeiros clássicos, senhores de si, indiferentes a moda de designs vanguardistas.
    A proverbialidade popular, sempre sentenciosa, convida à ponderação nos julgamentos precipitados – “As aparências iludem”. Espero não ser o caso. Que nestas belas mesas, ao som e à cor desta bela paisagem, se sirva boa cozinha. Basta que seja a nossa, a tradicional, aprendida com cozinheiras de mão cheia e fartos aventais, guardadoras seguras de segredos invioláveis.
    Bom apetite!


M. Hercília Agarez
Vila Real, 27 de Maio

sexta-feira, 24 de maio de 2019

Flor de esteva

Foto: josé alfredo almeida


Tive febres de todas as cores
me arderam todos os amores
rasguei seda, comi flores
fiz das tripas, coração
quase que aperto o botão
do juízo final
você já veio...


Alice Ruiz

quinta-feira, 23 de maio de 2019

A pureza abriu em flor

Foto:j osé alfredo almeida


   Esta flor floriu em Maio. Não fez mais do que a sua obrigação. Não está atrasada, em relação a colegas parideiras de outros frutos. Tem é o seu timing. Como tudo, na natureza e na vida. É como certas senhoras que eu cá sei que entram atrasadas em espaços públicos para que as toilettes se imponham a olhares enviesados… Feitios!
    Esta menina bonita tem a beleza da simplicidade. Impõe-se sozinha, apenas protegida pela manta verde esmeralda. Satisfaz-se com a sobriedade das suas poucas pétalas, de um ingénuo branco marfim. Bem no centro da corola, uma pérola nacarada lembra brinco de senhora distinta. Cerca-a, em dança de roda, o grupo dos estames, de tonalidade menos ténue, chamariz doce de insectos polinizadores.
    Embora em desequilíbrio de forças, secundariza ela as folhas rijas e luzidias. É dela que escorre o aroma adocicado, a provocar inspirações por narizes afinados. Mas, como diz o povo (certeiro em palavras), “quem ri no fim é que ri melhor”. Ou seja, quando a flor fanar, seguindo o seu destino de efemeridade, ficarão elas, as ovaladas vestimentas da laranjeira, impantes e chocarreiras assistentes de reboadas de farrapada de fim de ciclo. Manter todo o ano a folhagem, como fábrica em produção contínua, não é para quem quer, é para quem pode…


M. Hercília Agarez
Vila Real, 23 de Maio

quarta-feira, 22 de maio de 2019

Flor de acaso

Foto:josé alfredo almeida


Flor de acaso ou ave deslumbrante,
Palavra tremendo nas redes da poesia,
O teu nome, como o destino, chega,
O teu nome, meu amor, o teu nome nascendo
De todas as cores do dia!


 Alexandre O’Neill

terça-feira, 21 de maio de 2019

Pedras

Foto:josé alfredo almeida


"...mesmo as pedras, 
com o tempo, 
mudam”.




Cecília Meireles

segunda-feira, 20 de maio de 2019

Simplesmente a luz

Foto:josé alfredo almeida


Sorrindo, longe de tudo,
 cheia de luz.



Caio Fernando Abreu

domingo, 19 de maio de 2019

Bucolicamente

Foto:josé alfredo almeida


Simplicidade.
Simples cidade?
Um campo, aberto.



Francismar Prestes Leal

sábado, 18 de maio de 2019

Eternamente Douro-858


Foto:josé alfredo almeida



A secar, roupa modesta:
arco-íris desce às vinhas,

quebrando harmonia verde.


M. Hercília Agarez

sexta-feira, 17 de maio de 2019

quarta-feira, 15 de maio de 2019

Cheira a rosmaninho

Foto:josé alfredo almeida


Ainda nasce a lua nos moinhos
Ainda nasce o dia sobre os montes
Ainda vejo a curva do caminho
Ainda o mesmo som, a mesma fonte
Sabes meu amor não estou sozinho
Pelas salas do silêncio em que te escuto
Abro as janelas ainda cheira a rosmaninho
Vejo-me ao espelho, ainda vejo luto


João Ferreira-Rosa

terça-feira, 14 de maio de 2019

As rosas

Foto:josé alfredo almeida




Quando à noite desfolho e trinco as rosas

É como se prendesse entre os meus dentes

Todo o luar das noites transparentes,

Todo o fulgor das tardes luminosas,

O vento bailador das Primaveras,

A doçura amarga dos poentes,

E a exaltação de todas as esperas.



Sophia de Melo Breyner Andresen

segunda-feira, 13 de maio de 2019

domingo, 12 de maio de 2019

Jurei






Quando um dia tu partiste a ti jurei



De olhos postos nesse espelho a que me vi



Que ninguém me há-de ver triste e então pintei



Os meus lábios de vermelho para ti




João Monge 

sábado, 11 de maio de 2019

Janela fechada

Foto:josé alfredo almeida


Janela fechada:
borboleta na vidraça
dá cor ao meu dia.



Anibal Beça

sexta-feira, 10 de maio de 2019

Veja o que quiser...

Foto:josé alfredo almeida


A casa, velha.
Paredes, mofadas.
Fungos, flores...



Francismar Prestes Leal

quinta-feira, 9 de maio de 2019

Rosas

Foto:josé alfredo almeida



"Para as rosas, escreveu alguém, 
o jardineiro 
é eterno."


Machado de Assis

terça-feira, 7 de maio de 2019

Eternamente Douro-856

Foto:josé alfredo almeida




Tão suave o verde
das parras primaveris!
Tão filho único, o fruto!


M. Hercília Agarez

domingo, 5 de maio de 2019

Amor infinito




A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio
do que do cheio.
Falava que os vazios são maiores
e até infinitos.

Manoel de Barros

sábado, 4 de maio de 2019

A Deus...

Foto:josé alfredo almeida




Rosas brancas.
Um cheiro de paz.
Aqui, ora, jaz.



Francismar Prestes Leal

sexta-feira, 3 de maio de 2019

As rosas não falam

Foto:josé alfredo aslmeida 


Bate outra vez
Com esperanças o meu coração
Pois já vai terminando o verão enfim

Volto ao jardim
Com a certeza que devo chorar
Pois bem sei que não queres voltar para mim

Queixo-me às rosas, mas que bobagem
As rosas não falam
Simplesmente as rosas exalam
O perfume que roubam de ti

Devias vir
Para ver os meus olhos tristonhos
E, quem sabe, sonhavas meus sonhos
por fim



Cartola

quarta-feira, 1 de maio de 2019

O poeta do Moledo

Foto:josé alfredo almeida



"Moledo ou Caldas do Moledo não deixaram de ter seu nimbo espiritual. Não se julgue que  sejam apenas águas e paisagem - ambas maravilhosas. Ninguém pense que o seu território deu apenas, até hoje, vinho, azeite e fruta...
Deu mais...deu também um poeta que merece culto.
Merece, desde já, que as Caldas do Moledo, sua pátria, lhe dedique uma placa comemorativa do seu nascimento, a 19 de Marco de 1902.

(  Por  lapso o escritor JAC indicou mal a sua data de nascimento: 15 de Março de 19022)  

Sabe o meu leitor que já uma vez me referi, no Comércio do Porto, ao poeta das Caldas do Moledo, que se chamou Antão de Morais Gomes.

(...)

Da recolha de José de Castro, menos acessível que o livro único, dê eu aqui uma pequena amostra. Seja, por ser muito duriense, o soneto intitulado 
"O Meu Carro de Bois". É como segue:



Possuo há muito um carro e uma agulhada.
Se me faltam os bois, que vão tirar.
Para levar um dia uma carrada
A quem quiser, a quem ma encomendar.

Dentro de pouco tempo, pela estrada.
Hei-de ir à sua frente, a assobiar.
Obrigando-o a comprida caminhada.
Até voltar de novo ao seu lugar.

Querendo Deus, hei-de comprar à feira
Uns bezerrinhos novos, de maneira.
Que sejam de bôs mães pequenas crias...

Hei-de os beijar, para os jungir depois...
Ninguém terá no seu carro de bois
Compêndio de tamhas alegrias!



Poderá haver mais cândida ternura? O Moledo tem a obrigação de perpetuar a memória do seu poeta.

João de Araújo Correia