quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Arte na paisagem

Foto:josé alfredo almeida


É agora o tempo das podas - como calculam. A seiva está morta nos caules e nos ramos. As filas de choupos que bordam os ribeiros são teorias de espectros, almas penadas da Primavera e do Verão. Que, onde melhor se conhece o Inverno é aqui, no sítio onde eu moro, entre vinhas baixas. As curvas destes montes rebentavam de verde ainda o outro dia, veio o Outono, tingiram-se de roxo, lambuzaram-se de oiro. Desta pompa nada resta. Cepas e vides nuas cingem o corpo dos montes. É um abraço de esqueletos. Coisa triste… Apenas a anima o trabalho dos homens, o tic, tic, tic e a cintilação dos bicos das tesoiras. É o tempo das podas, é a vez dos podadores. Eles curvam-se como cirurgiões teimosos sobre o ventre das videiras mortas. Cortam, chapotam, bafejam – hão-de ver se ressuscitam. Já nos cerros abriu a flor da amendoeira. Vem aí a seiva. É preciso podar.


João de Araújo Correia in Três Meses de Inferno

Penumbra

Foto:josé alfredo almeida

Pontes da Régua-855

Foto:josé alfredo almeida

Nossa Senhora dos Remédios:o projecto e a obra de arte


segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Outono dourado

Foto:josé alfredo almeida

 
Quando as palavras rivalizam com as tintas. Pintura poema ou poema pintura? Vamos às metáforas, as cores da paleta dos poetas, a melhor maneira de honrar esta imagem que  banalidades podem macular.

Árvore. Coluna inclinada, (quase) sem capitel. Pergaminho de rugas fundas como pele de mulher velha. Cabelos de ouro em cabeça semi-decepada. Tentáculos negros reflectidos em mar doce. Ainda agasalhados de amarelo.

Águas espelhos.  Alcatifa em tons pastel debruada de fita verde.  Luz inebriante, avassaladora, esconjuro de escuridões de alma.  Sol ressuscita esperanças mortas.  Amostras de céu lavado acalmam desassossegos.

Outono dourado. Para viver intensamente a doce melancolia  de um tempo com pressa.



Vila Real, 26 de Novembro de 2016
M. Hercília Agarez

Pontes da Régua-853

Foto: josé alfredo almeida

Lamego imaginado

Foto;josé almeida

Lamego desconhecido


sábado, 26 de novembro de 2016

Rompendo a neblina

Foto:josé alfredo almeida


Uma verticalidade jovem e enfolhada irrompe da neblina matinal. Despiu o "manto diáfano"* e exibiu-se em corpinho bem feito. Vaidosa, como menina enamorada. As companheiras, ciumentas, fugiram para  outros chãos.

À tarde espera a habitual visita do vento. Muito gosta ele de bailar com as suas folhas! Agarra-as, sensualmente, ao ritmo de valsa de Strauss. Enquanto é tempo de baloiçarem em suspensão sublime. Aproxima-se a despedida.  A "nudez forte da verdade"* ameaça, dia após dia. Restará, em breve, a imagem negra da rendição.

O banco, arrepiado, aguarda um sol prometido. O rio, esse, vê-se em palpos de aranha para rasgar aquele lençol que, maldosamente, tenta esconder-lhe o esplendor.

Uma árvore. Como tantas outras. Mas esta a fazer continência à bandeira...

* palavras de Eça de Queiroz


Vila Real, 25 de Novembro de 2016
M. Hercília Agarez

Pontes da Régua-851

Foto:josé alfredo almeida

Sossegada

Foto:josé alfredo almeida

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Era Outono

Foto:josé alfredo almeida

Começaram as primeiras chuvas.
Da terra desprendem-se cheiros, as cores da natureza alteram-se. A chuva e a brancura das manhãs, cria em mim, uma alegria (quase) de criança.



O Outono começara. 
Era o regresso às aulas.

Um manto branco cobria o rio.
Como um presente ou um livro que se abria lentamente, as nuvens dispersavam-se,
a beleza das cores, o mistério das pontes e o céu tão alto (mas infinitamente mais perto do
que nas cidades grandes, repletas de prédios e arranha-céus), ficavam a descoberto.

Mil flores, de várias tonalidades debruçadas sobreo o rio, 

em escadas e caminhos desenhados à mão. 
Pelo homem e creio eu, por um Deus.
As árvores de folhas acobreadas e os muros de flores ainda azuis e amarelas, iam aos poucos
atapetando os meus passos leves de criança. 

No regresso da escola, nas tardes em que o sol se esquecia do tempo, eu subia dois a dois os
degraus das escadas da minha casa em direcção ao quintal, sobranceiro ao rio Douro. 

As flores, as árvores numa metamorfose de cores.

Era Outono. 

De alguma forma eu sentia, que aqueles momentos aquela beleza rara, era para guardar.
Porque tudo mudava. 

Eu iria mudar também. 
Mas sem perder a capacidade do deslumbramento.
E da essência das coisas (da vida).

Ana de Melo                                                                                                    

Tronco nu

Foto: josé alfredo almeida

Pontes da Régua-850

Foto: josé alfredo almeida

sábado, 19 de novembro de 2016

Régua minha

A Régua -  Quadro atríbuído ao Barão de Forrester




"A Régua vai cada vez em aumento, especial na margem do rio aonde se tem construído muitos e belos armazéns para os depósitos de vinha. A principal casa é a da da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro - na  qual se fazem as reuniões das provas. Antiga mento era curioso estar no Peso ( parte alta da vila) ou na Régua (zona ribeirinha) na época da feira, quando os lavradores vinham vender e os negociantes comprar vinhos novos. Há muito boas casa na Régua como no Peso, e entre elas há fortunas colossais. Todos os habitantes têm mais ou menos vinhas, e as pessoas principais são comissários de várias casas do comércio do Porto."


Barão de Forrester 

Paisagem à janela

Foto: josé alfredo almeida

Museu do Douro-84

Foto:josé alfredo almeida

Pontes da Régua-845

Foto:josé alfredo almeida

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

O Douro tem mais encanto...

Foto:josé alfredo almeida


Todos os tons como numa rosácea, todas as cores como num vitral.
                                                                                                          
Pina de Morais



Não deram ainda por findo o seu papel no palco da natureza vinhateira. Foram valentes parideiras de cachos úberes protegidos por pâmpanos arrebicados. Permitiram, impotentes, que invadissem a sua privacidade tesouras de poda e facas afiadas, agressoras. Levaram-lhes os filhos, aconchegados em cestas berços. Deixaram-nos ir. Sacrificaram-nos a Baco/Dioniso. Ou ao Homem. Ao Homem do Douro. Àquele que tem nelas, vinhas cuidadas como se gente fossem, a sua riqueza e a sua alegria. O seu orgulho e a sua vaidade. Antes de o lavrador sofrer uma má colheita, já elas foram golpeadas por gelos e granizos. Já elas tremeram espavoridas com medo às trovoadas.
Acabada a festa, abençoada (ou castigada?) por eflúvios ainda estivais, cada trabalhador regressa a sua casa ainda embriagado de cheiro a mosto. Missão cumprida. Desertas, repousam as guerreiras, estendidas ao sol, como lagartos. Dão ares das suas graças coloridas. Exibem-se em seus trajes de cerimónia. Está a chegar a hora da despedida, aquela que dizem ter mais encanto.
Admiradores dos seus novembros captam-lhes a magia cromática. Param e olham. Nada escutam porque a passarada foi chilrear para outras freguesias. Resta a paz da beleza silenciosa.



Vila Real, 16 de Novembro de 2016

M. Hercília Agarez

Pontes da Régua-843

Foto:josé alfredo almeida

Barco na paisagem-228

Foto:josé alfredo almeida

Postal do verão-44

Foto:josé alfredo almeida

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Paisagem sentimental

Foto:josé alfredo almeida


É impossível
quando procuras
um mapa 
um espelho
um lugar onde assinalar estes desaparecimentos



Marta Chaves

Pontes da Régua-842

Foto:josé alfredo almeida

Postal do verão-43

Foto:josé alfredo almeida

Cartaz cultural - OMIRI







Com entrada gratuita, a ver o concerto do projecto OMIRI, no dia 19 de Novembro, pelas 21.30horas, no beloTeatrinho da Régua!


Omiri é, acima de tudo, remix, a cultura do século XXI, ao misturar num só espectáculo práticas musicais já esquecidas, tornando-as permeáveis e acessíveis à cultura dos nossos dias, isto é, sincronizando formas e músicas da nossa tradição rural com a linguagem da cultura urbana.




Para reinventar a tradição, nada melhor que trazer para o próprio espectáculo os verdadeiros intervenientes da nossa cultura; músicos e sons de todo o país a tocar e a cantar como se fizessem parte de um mesmo universo. Não em carne e osso mas em som e imagem, com recolhas transformadas e manipuladas em tempo real, servindo de base para a composição e improvisação musical de Vasco Ribeiro Casais.


Em Omiri a música e cultura portuguesa é rica e gosta de si própria, como é o caso deste tema divertido musical:https://www.youtube.com/watch?v=J5CtH3vbbkY