quarta-feira, 11 de maio de 2016

O homem na vinha, a vinha no homem




    Não passam um sem a outra. Ela, exigente, possessiva, sempre a reclamar que dela se ocupem, como dama vaidosa. Ela, intolerante, não permitindo atrasos, marca o ritmo de enxadas, de engaços, de pás, de sacholas, de tesouras de poda, de ferros. Não dá tréguas. Senhora da sua importância, faz valer o seu valor.  Parece indiferente a suores de rostos e de corpos, a ares arreguiçados de frios de roupa pouca, a cansaços  calados com zurrapa revigorante. A peso de pulverizadores a transbordar de calda bordalesa. De cestos vindimos  a abarrotar de uvas condenadas, a caminho do lagar, seu lugar de sacrifício.
    Jornaleiro. Terras não tem. Talvez uma horta com coibes para o caldo. Anda à jeira. Poucos os direitos, muitos os deveres. Deixá-lo. É seu único ganho, o trabalho na terra. Nela lhe nasceram os dentes, nela lhe cairão. Ama-a como se sua fosse. É o seu mundo, o seu espaço de vida entre o nascer e o pôr do sol. Empunha alfaias suas que as dos outros não estão afeitas à sua mão, ao tamanho do seu corpo. São o seu património, as armas com que se defende das ofensivas da vida. Até podem servir para abrir o verde ao vizinho...
    O homem e a vinha, a vinha e o homem. Um duo indissociável.  Dois em um.

    
Vila Real, 10 de Maio de 2016
M. Hercília Agarez

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