sexta-feira, 20 de março de 2015

Lágrima

Foto: josé alfredo almeida




Todos os que vivemos em regiões de vinho sabemos que as vinhas montam para nós, com grande generosidade, um doce espectáculo de cores e formas: o final rubicundo e dourado do Verão, os ramos e troncos pardos com que o Inverno atinge o seu pico e os botões de verde esperança que anunciam a Primavera.

No Inverno, sob a chuva miúda e constante, as vinhas, tanto aquelas que são aramadas como sobretudo as outras, que crescem retorcidas mais junto à terra, apertam-nos a alma e apavoram-nos o espírito: parecem ossos de mortos de onde se desprendem cabelos longos, esparsos e retorcidos. Os ramos, ainda não podados e de há muito desprovidos de folhas ou frutos, tremem sob o vento e a chuva sem qualquer alegria. É talvez por isso que os cultivadores gostam de chegar às vinhas com as suas tesouras e serrotes. Num instante, os terrenos lamacentos e devastados de folhas, ficam a parecer bem, com os ramos podados e limpos, nítidos como a vontade do corte. É nessa altura que, ao ver as lágrimas felizes da chuva a caírem lentamente do ramo onde a Primavera fará crescer ramos, folhas, gavinhas, cachos, é nessa altura que nós próprios, abrigando-nos ainda da chuva e do frio, queremos que o tempo se apresse, o sol se mova no céu, os pássaros cheguem de longe, e a vinha se cubra com o verde da vida.  

Paulo Varela Gomes

2 comentários:

  1. A vida é breve. .e não podemos prolongar-nos,,.....
    É"urgente" olhar o Sol ..é mais "urgente " ainda amar ,
    a vida !!!!
    Um belo momento de leitura!

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  2. Uma "lágrima" que cai..
    num choro "alegre" , feliz..
    Um momento de leitura agradável !stá breve a "chegada "da Primavera !

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