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Foto: Noel de Magalhães |
terça-feira, 31 de março de 2015
À beira da água
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Foto: josé alfredo almeida |
Estive sempre sentado nesta pedra
escutando, por assim dizer, o silêncio.
Ou no lago cair um fiozinho de água.
O lago é o tanque daquela idade
em que não tinha o coração
magoado. (Porque o amor, perdoa dizê-lo,
dói tanto! Todo o amor. Até o nosso,
tão feito de privação.) Estou onde
sempre estive: à beira de ser água.
Envelhecendo no rumor da bica
por onde corre apenas o silêncio.
Eugénio de Andrade
segunda-feira, 30 de março de 2015
Os Desenhos de Ana Margarida -4
Anda comigo ver...
Um lugar onde (não) entrei
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A Régua, 1880 |
Encontro-me
à mesa da minha secretária, num entardecer outonal com a luz a resplendecer nas
águas do rio e nos vinhedos que serpenteiam o vale Abraão, absorvido na leitura
de um livro que, de um momento para o outro, me leva às vindimas no meu Douro.
Enquanto ouço, lá no meio dos socalcos coloridos, os cantares das vindimadeiras
e os sons de uma gaita-de-beiços, um harmónio, os ferrinhos e os bombos que
acompanham o pisar das uvas pelos homens, deixo-me viajar no tempo em direcção
ao passado.
Acabo de
chegar à vila da Régua dos finais do século dezanove. O comboio que me trouxe
terminou aqui a sua marcha, apenas com um ligeiro atraso relativamente ao seu
horário. Estou na estação, que esconde muita da sua beleza arquitectónica nos
ramos dos frondosos plátanos. Da sua porta principal, começa a sentir-se o
bulício de pessoas e dos transportes na estrada nacional que lhe passa em
frente. Sinto odores de vinho fino que se misturam com perfumes de flores
silvestres. As diligências da viúva Vilela, empresária e benemérita, estão de
saída para outras paragens.
A vila está
a crescer e o comércio prospera, mas é a sua beleza que atrai a atenção do meu
olhar e me deixa, por breves instantes, extasiado pela luz e pela intensidade
das cores de uma paisagem fascinante que alastra até às margens do rio. Sou
despertado por uma velha rebuçadeira de bata branca que vende pacotinhos de uns
rebuçados embrulhados em papel. Compro-lhe dois pacotinhos e delicio-me com o
aroma de flor de laranjeira de um doce rebuçado
da Régua.
Olho as
horas no relógio da estação, está muito calor, decido passear-me pela Rua da
Bandeira, o coração da vila, onde se faz todo o comércio de retalho, as casas exportadoras
guardam o vinho e as aguardentes, onde ficam as hospedarias e as pensões e se
encontram as figuras mais respeitáveis da terra. Depois de fazer uma ligeira
refeição numa hospedaria mais recomendada, quero visitar a Loja do Zé Pinto,
progressista ferrenho, e aí comprar a última edição do bi-semanário O Douro.
O jornal interessa-se por divulgar os assuntos da lavoura, do comércio dos
vinhos e a gestão da câmara do regenerador Dr. Júlio Vasques. À entrada desta
loja, onde se vende um pouco de tudo, deixo o meu olhar penetrar numa sala para
aí rever figuras ilustres numa roda de cavaqueira e que, agora, me parecem
almas retiradas das profundezas da Eternidade ou de um outro mundo. Na verdade,
não os conheço nem eles me conhecerão a mim, mas nutro por eles uma
indisfarçável admiração, simpatia e respeito pelo que fizeram no seu tempo. Se
eu pudesse falar com alguns deles, seria com o poeta Camilo Guedes Castelo
Branco, que continua a usar a sua farda de soldado
da paz.
Retomo a
minha caminhada e, de uma viela que circunda o Largo do Cruzeiro, vejo passar o
senhor Afonso Soares, de barbas brancas e olhos luminosos. Deve ter acabado o
seu repasto, porque fuma com redobrado prazer. Disseram-me que é um apreciador
de sável, um saboroso peixe que ainda se pesca no rio Douro. Bem gostava de o
ter convidado para provar comigo esta deliciosa especialidade gastronómica, mas
o senhor Soares é um artista diletante, jornalista, escritor, erudito e pintor.
Quase que desconfio que não pode dissipar nenhum do seu precioso tempo com um
estranho que lhe apareça assim de frente. Tem mesmo muito que fazer e deve
estar preocupado com o futuro da corporação de bombeiros, onde acabou de ser
escolhido para Comandante.
Desço a
ruela das Vareiras, com as tabernas que vendem os vinhos mais baratos e
apreciados pelo povo e onde crescem negócios em que o sal e a sardinha salgada
de barricas são as principais mercadorias. Ao fundo da rua sobressai o areal
extenso por onde corre o rio e voam vertiginosamente as últimas andorinhas,
anunciando que estão de partida. Um barco rabelo de vela içada, carregado com
cinquenta pipas de vinho da feitoria, produzido pela firma Martinez e Gassiot,
solta as amarras de um movimentado cais fluvial.
Como se faz
tarde, aproximo-me da Rua Nova para me dirigir à Casa da Companhia. No seu
átrio, juntam-se lavradores, comerciantes, corretores e comissários das casas
inglesas. Enquanto uns discutem os preços da pipa de vinho da vindima, outros
exibem amostras de colheitas antigas. O preço da pipa ronda os 25.000 mil réis,
e os viticultores estão insatisfeitos. Diante de mim, tenho os senhores
Francisco Ferreira e António Claro, fiéis empregados da Casa A.A. Ferreira,
Scrs. Estou surpreendido: os lavradores, numa
veneração digna de deuses, saúdam-nos com vénias e mesuras. Gostava de
cumprimentar a D. Antónia, a Ferreirinha,
que deve estar pela Quinta das Nogueiras, e agradecer-lhe a generosidade para
com a associação de bombeiros, que, como primeira sócia contribuinte, muito
ajudou nos primeiros anos de existência.
Quem eu
vinha procurar, um tal comissário da casa Sandeman, não encontrei. Ali perto,
está a relojoaria de Adolfo Pauman, um velho actor galego que deixou as artes
cénicas para ser bombeiro voluntário e se dedicar ao comércio reguense. A porta
da loja está encerrada, pelo que decido entrar na Botica do Anastácio,
outro memorável ponto de tertúlia. Ao balcão, está um moço que avia umas receitas de pomadas. Pergunto-lhe pelo
paradeiro do senhor António Roberto Pinto. Depois de sair o cliente, diz-me que
devo encontrá-lo na casa da Real Associação dos Bombeiros, no Largo da
Chafarica, onde ao fim da tarde costuma ir jogar dominó, quino e frequentar a
sala de leitura. Meto as pernas ao caminho em direcção à Rua da Boavista e, em
pouco tempo, chego ao quartel dos bombeiros voluntários, instalado numa casa
antiga, o rés-do-chão para arrumar as bombas e o primeiro andar para reuniões e
encontros de lazer.
É domingo,
e as badaladas do sino da capela do Senhor do Cruzeiro dão as seis horas da
tarde. Alguns associados, mais habituados a frequentarem a sala de jogos e a
casa de leitura, apressam-se a entrar no quartel. Reconheço o senhor António da
Silva Correia, solicitador, e o Dr. Júlio Manso Preto, jurisconsulto e
publicista que exerce o foro na vila. Ninguém sabe onde nasceu, mas aqui se
radicou e fez família. Intriga-me que deste autor ninguém tenha dado atenção ao
folheto que publicou em 1864 com o sugestivo título Duas Palavras Acerca da
Régua e Arredores. Não o li, mas o
seu autor faz aí um magistral retrato poético desta terra, então com
poucas ruas, algumas com bons edifícios elegantemente construídos, notável pelo
seu comércio de vinhos. Ele, que adoptou esta terra para viver, viu beleza nas
colinas tapeteadas de vinha e polvilhadas de casario branco, um encanto para o
olhar, donde se avistava um rio forte, sem igual, e os enormes
sabugueiros em flor.
Atravessa o
Largo da Chafarica, vindo do seu escritório, um jovem que começara a advogar
como sucesso. Apaixonado pelos ideais republicanos, vai dedicar-se com afinco a
resolver as mais problemáticas das questões do Douro. O causídico chama-se
Antão de Carvalho e está a iniciar o brilhante futuro que o levará ao cargo de Ministro da Agricultura, logo após
a instauração da República, e depois a ser o mais dinâmico dos paladinos do
Douro.
Aproxima-se
o abastado comerciante Joaquim Sousa Pinto, fardado de bombeiro, acompanhado
pelo Comandante Afonso Soares e pelo presidente da direcção, Alberto Pereira
Rolla, sendo saudados com continência por um piquete de voluntários. Param
diante de mim e, como não me reconhecem familiar ao meio, cumprimentam-me com
um afável “Boa tarde, meu caro amigo”. De imediato, o Comandante Afonso Soares,
que traz na mão esquerda um manuscrito do livro que irá publicar, os Apontamentos para a História da Vila e
Concelho, abeira-se de mim e pergunta-me se me pode ser útil. Digo que sim,
que procuro o senhor António Roberto Pinto, comissário da casa comercial
Sandeman, a quem precisava de dar umas palavras...! Avisa-me que deve estar a
chegar para entregar um donativo da casa Sandeman para ajudar a missão dos
bombeiros. Ainda o ouço exclamar: “Bem precisamos de dinheiro….”. Entretanto,
pergunta-me se me fiz associado contribuinte. Não sei como lhe responder, mas
prometo ao Senhor Soares que, mais tarde, aparecerei para me inscrever como
sócio e é o que faço….um século depois.
As
badaladas do sino do Cruzeiro voltam a ouvir-se dolentemente e fazem-me acordar
de um sono profundo, aconchegado pelo calor outonal. Tenho aberto o livro de
actas dos mandatos das primeiras direcções dos bombeiros da Régua. Cá está o desconhecido comissário que
não tive a sorte de encontrar na minha viagem ao passado. Uma acta da
reunião extraordinária da Direcção dos Bombeiros datada de 1893 confirma-me
que, nesse dia, esteve presente o “Sr. António Roberto Pinto comissário da casa
ingleza Sandeman, tendo por este entregue á hora desta sessão a quantia
de 25.00 mil réis, que a mesma offerece para os fundos da Associação.
Deliberou-se por unanimidade agradecer a oferta”.
A Sandeman,
como casa comercial, morreu; aquele mítico nome pertence agora a outra empresa
de vinhos, a Sogrape. Com ela morreram também os influentes comissários das
casas inglesas, sobre os quais o escritor João de Araújo Correia escreveu o
seguinte: “Governam-se melhor que o lavrador e quase tão bem como o comerciante.
Estabelecem entre um e outro uma risca de união perfeita de metal precioso. Ser
comissário é ser alguém. Ser comissário de casa inglesa é porventura ser mais
do que alguém. (…) Ser empregado de ingleses, no Douro, é ser gente estremada –
ainda que o emprego se exerça numa adega com caneco à cabeça. Se o emprego é
porém de vulto, se representa confiança e espelha a bizarria inglesa, o
empregado chama-se comissário e é um lorde. É um lorde entre lavradores
preocupados com colheitas e com vendas”.
Já cá não estão
estes lordes da sociedade duriense
para defenderem o seu bom nome. Morreram todos. Perdura o nome do Sr. António
Roberto Pinto, que, apesar de nada sabermos acerca dele, deixou uma fama de
benfeitor dos bombeiros da Régua.
Devia
acabar aqui esta pequena história. Mas, o mais certo, é ela continuar para acrescentar o exemplo da casa Symington - sócia contribuinte nº 578 – que assim concede o seu apoio a uma instituição
humanitária que tem como seu ideal fazer o bem comum.
José
Alfredo Almeida
domingo, 29 de março de 2015
Certezas
Perto do mar
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Foto: josé alfredo almeida |
“O maior e o mais velho amor, é o amor pela
vida.”
―Plutarco
Tudo era claro:
céu, lábios, areias.
O mar estava perto,
fremente de espumas.
Corpos ou ondas:
iam, vinham, iam,
dóceis, leves – só
ritmo e brancura.
Felizes, cantam;
serenos, dormem;
despertos, amam,
exaltam o silêncio.
Tudo era claro,
jovem, alado.
O mar estava perto.
Puríssimo. Doirado.
eugénio de andrade
Para namorar
sábado, 28 de março de 2015
APELO
Em busca das memórias perdidas das Caldas do Moledo
A Tertúlia João de Araújo Correia vai organizar, em breve, um roteiro em torno de um dos lugares mais bonitos da região - as Caldas do Moledo. Esse espaço mereceu ao escritor inúmeras crónicas desde a década de 50 até aos anos 80.
Em PÁTRIA PEQUENA, numa crónica sobre este assunto ele diz: "Houve tempo em que as Caldas do Moledo, a dois passos da Régua, foram em cada Verão sala de visitas da Régua. (...).
E questiona-se sobre as razões que as levaram à situação de abandono a que foram votadas.
E questiona-se sobre as razões que as levaram à situação de abandono a que foram votadas.
O tema continua cheio de actualidade.
A Tertúlia gostaria muito de ilustrar com imagens esse conjunto de textos que João de Araújo Correia produziu e montar, se possível, uma exposição de fotografia (actuais e do passado) sobre o assunto.
Daí o apelo: possuem, ou sabem quem possui, fotos antigas, postais ilustrados, cartazes e outros documentos que possam ser digitalizados e reproduzidos? Em caso afirmativo, contactem-nos, por favor, através de mensagem no facebook ou através do e.mail tertulia_jac@sapo.pt
Daí o apelo: possuem, ou sabem quem possui, fotos antigas, postais ilustrados, cartazes e outros documentos que possam ser digitalizados e reproduzidos? Em caso afirmativo, contactem-nos, por favor, através de mensagem no facebook ou através do e.mail tertulia_jac@sapo.pt
Beleza pura
Aquela casa
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Foto: josé alfredo almeida |
Só porque tu existes.
Com o teu cheiro,
os teus passos leves.
As janelas são os olhos por onde vemos o nosso mundo.
Ora agreste, ora doce.
Calado como tu,
ou cheio de cores rubras e violeta,
também como tu.
O correr do rio, que confundo com o som do teu riso, e este céu imenso, como um manto sobre nós...
Esta casa onde os teus olhos poisam de mansinho
quando acordas e assim, se acende como fogo a crepitar de vida e me consome em ternura...
Aquela casa, dirão:
-É dali que Deus espreita o mundo!
E eu sei, que as janelas de Deus, são os teus olhos.
ana de melo
sexta-feira, 27 de março de 2015
Res nullius
Horas de chegar...
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Foto: josé alfredo almeida |
Tempo — definição da angústia.
Pudesse ao menos eu agrilhoar-te
Ao coração pulsátil dum poema!
Era o devir eterno em harmonia.
Mas foges das vogais, como a frescura
Da tinta com que escrevo.
Fica apenas a tua negra sombra:
— O passado,
Amargura maior, fotografada.
Tempo...
E não haver nada,
Ninguém,
Uma alma penada
Que estrangule a ampulheta duma vez!
Que realize o crime e a perfeição
De cortar aquele fio movediço
De areia
Que nenhum tecelão
É capaz de tecer na sua teia!
Miguel Torga
Azinheira
Até ao céu
quinta-feira, 26 de março de 2015
Lavar os cabelos no rio
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Foto:josé alfredo almeida |
Ao contrário de ti
não tenho ciúmes.
Vem com um homem
às costas,
vem com cem homens nos teus cabelos,
vem com mil homens entre os seios e os pés,
vem como um rio
cheio de afogados
que encontra o mar furioso,
a espuma eterna, o tempo.
Trá-los todos
até onde te espero:
estaremos sempre sozinhos,
estaremos sempre tu e eu
sozinhos na terra
para começar a vida.
Pablo Neruda
Luz que fica
quarta-feira, 25 de março de 2015
Procurando a luz para ver as sombras
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Foto: josé alfredo almeida |
Em S. Leonardo De Galafura - Peso da Régua, Setembro/2014
Da varanda do quarto
viam-se
em vez das aliterações
o vale
e os pinheiros bravos
a subir
o monte. Acordava-se assim
a ver as coisas
concretas. Como se
afinal
além da literatura houvesse
mundo: casas;
pessoas; pássaros que
voavam mesmo.
José Carlos Barros
Chão das sombras
terça-feira, 24 de março de 2015
Poeta Obscuro
Montes ermos
segunda-feira, 23 de março de 2015
Primavera
MEZIO-3
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Foto: josé alfredo almeida |
És precária e veloz, Felicidade.
Custas a vir e, quando vens, não te demoras.
Foste tu que ensinaste aos homens que havia tempo,
e, para te medir, se inventaram as horas.
Felicidade, és coisa estranha e dolorosa:
Fizeste para sempre a vida ficar triste:
Porque um dia se vê que as horas todas passam,
e um tempo despovoado e profundo, persiste.
Cecília Meireles
sábado, 21 de março de 2015
Lembrar M. Nogueira Borges
Acreditem-me ou não, o que
escrevi SINTO-O. Sabes, a vida é feita por NÓS, "OS SIMPLES", OS QUE ANDAM AQUI
COM UMA LUZ NO CORAÇÃO. SÓ TEMOS QUE FAZER UMA "COISA": AGRADECER A QUEM
NOS DEU ESSA FELICIDADE!
M. Coutinho Nogueira Borges em 7 de Fevereiro de
2012
Fazer fotografias
sexta-feira, 20 de março de 2015
O nosso eclipse
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Foto: josé alfredo almeida |
"Olhemos hoje de manhã para o Sol, através das nuvens, para perceber os eclipses totais são relativos e passageiros. Assim acontece também com o declínio e a decadência de Portugal e dos Portugueses: o mal é de longa duração, com tão curta aparência, que acaba por ser como começou: como a nossa condição."
Miguel Esteves Cardoso in jornal "O Público" de 20 de Março de 2015
Lágrima
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Foto: josé alfredo almeida |
Todos os que vivemos em regiões de vinho sabemos que as vinhas montam
para nós, com grande generosidade, um doce espectáculo de cores e formas: o
final rubicundo e dourado do Verão, os ramos e troncos pardos com que o Inverno
atinge o seu pico e os botões de verde esperança que anunciam a Primavera.
No Inverno, sob a chuva miúda e constante, as vinhas, tanto aquelas que
são aramadas como sobretudo as outras, que crescem retorcidas mais junto à
terra, apertam-nos a alma e apavoram-nos o espírito: parecem ossos de mortos de
onde se desprendem cabelos longos, esparsos e retorcidos. Os ramos, ainda não
podados e de há muito desprovidos de folhas ou frutos, tremem sob o vento e a
chuva sem qualquer alegria. É talvez por isso que os cultivadores gostam de
chegar às vinhas com as suas tesouras e serrotes. Num instante, os terrenos
lamacentos e devastados de folhas, ficam a parecer bem, com os ramos podados e
limpos, nítidos como a vontade do corte. É nessa altura que, ao ver as lágrimas
felizes da chuva a caírem lentamente do ramo onde a Primavera fará crescer
ramos, folhas, gavinhas, cachos, é nessa altura que nós próprios, abrigando-nos
ainda da chuva e do frio, queremos que o tempo se apresse, o sol se mova no
céu, os pássaros cheguem de longe, e a vinha se cubra com o verde da vida.
Paulo Varela Gomes
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