sábado, 11 de março de 2017

Elogio das árvores

Foto:josé alfredo almeida


O Sr. Barroso de Moura, regente-agrícola, não errou a vocação. É homem votado à terra, que não pode ver nua. Sente-se bem dentro do seu cargo. Dedica-se à arborização, que elogia e defende como técnico devoto. Sonha com incêndios, que podem destruir, num sopro, todos aqueles pinhais, que vão revestindo as serras próximas de Vila Pouca. Serras que foram pardas, são hoje serras verdes. Não é pena que o fogo lhes queime a bela túnica num abrir e fechar de olhos? O Sr. Barroso não come nem dorme sossegado. Come com o fogo e dorme com o fogo.
(…)
O Sr. Barroso aproveitou os nossos passeios para me fazer o elogio da floresta. Não era preciso, que eu bem sei quanto vale… Cabeços e pendores escalvados são agora ricos de boas cabeleiras. O pinheiro bravo, rústico de todo, contenta-se com uma película de terra. Diz que não precisa de mais e que, embora marítimo, se vai afeiçoando às altitudes. Promete fixar terrenos pobres, e até enriquecê-los, transformando-os em humo, onde quer que o plantem.
O pinheiro silvestre, ornamental como se fosse importado para parques senhoriais; o castanheiro, o carvalho e outras espécies de elevado coturno português não deixam de se plantar onde a terra os permite. Vi carvalhos e castanheiros antes de chegar ao alto do Minheu, como caixilho de imensa rechã, onde crescia uma rica erva. (…)
Crê o Sr. Barroso que o fogo das matas é fogo posto. Digo que sim, mas, é difícil surpreender no trabalhinho os incendiários. Só a educação do povo, teimosa como a gota de água em pedra dura, o poderá amolecer no sentido de amar o arvoredo. Mas, onde se hão-de recrutar os educadores? Em mil portugueses, haverá um, por milagre, que não odeie as árvores. A maioria quer tudo amplo…


31-10-70
João de Araújo Correia in Pó Levantado

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