segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

No memorial de Lobrigos






No centenário do nascimento de João de Araújo Correia
Autor: Camilo de Araújo Correia
Editora: Brasília Editora/Porto-2000





"João de Araújo Correia teve sempre à sua volta muitos amigos pessoais e muitos devotos da sua literatura.Um grupo de amigos mais amigos e devotos mais devotos quis memoriar neste desvão da estrada as muitas paragens que aqui fazia no seu resignado "carocha". E digo resignado, recordando as buzinadelas, as acelerações e as mudanças que fazia desnecessariamente, cumprindo regras muito pessoais da condução...
Estou certo que meu pai vinha aqui passar uns minutos do recreio espiritual, a fugir à impertinência do telefone, à cantilena dos doentes, ao bruáá familiar, ao chamamento do papel em branco ávido da sua pena, ao tédio que sempre persegue os homens de espírito insatisfeito.
Desligava o motor, acendia um cigarro e perdia sempre o olhar e o pensamento na paisagem duriense que daqui se oferece esplendorosa e diversa.
Algumas vezes o acompanhei. À vinda e à ida conversava naquele tom pausado que todos conheciam. Mas aqui estava sempre calado. De uma vez, disse, pensando alto:

"O Douro é sempre belo e majestoso de onde quer que se veja, de onde quer que se sinta".

- Pois é...- disse eu, sentindo, imediatamente que mais valia estar calado.
-Hum?!! - estranhou meu pai, como se tivesse acabado de chegar à terra.
Ainda hoje ouço aquele Hum?!! como um castigo que a minha frivolidade mereceu."


Camilo de Araújo Correia 

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