Foto:josé alfredo almeida |
Cavador do Douro. Ou jornaleiro. Porque cava, porque trabalha
à jorna. Mudou a sua imagem, mudaram as suas condições de vida e de trabalho,
não o seu ofício, o peso de enxadas e ferros e pás. Não o cheiro a terra
enterroada, o tempo de entrar em cena na novela da vinha – “Cavas em Março e
arrendas pelo S. João, todos o sabem mas poucos o dão”. Não os materiais das
suas alfaias, inseparáveis aliadas, seu complemento directo. Pau rijo em ferro
afiado. De geração em geração.
Mudaram os panos
das suas roupas: o serrobeco, o cotim, de calças remendadas, o algodão riscado
de camisas abertas até ao umbigo, mata-borrões de suores quentes. Já não pés
nus ou entrados em socos sonoros, cheios de gretas que a terra rasgou. Já não chapéus
em palha, de abas largas, guardas de sóis e de chuvas.
Na estatuária
portuguesa o cavador, que ela amoravelmente eternizou, surge curvado, em arco,
posição obrigatória no acto de pôr o solo arável em reboliço. Não é o caso,
nesta bela escultura. Aqui o camponês é apanhado em flagrante descanso. Como
soldado que pousa a espingarda que lhe derreia as costas, ele depõe a enxada em
que arrima um cansaço por breve pausa. Serve ela de bengaleiro ao entrançado
que lhe é de tecto diurno. Com a mão direita segura o lenço-rodilho sobre o
pescoço, travando o livre curso de bravas bagas de odor acre.
Cavador do Douro,
cavas terra preciosa. Que te desforres quando ela se desfizer em frutos. Tornar-te-ás, então, vindimador?
M. Hercília Agarez
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