Perdem-se na memória os anos em que Lamego
colecciona um património arquitectónico e cultura ímpar. Era uma cidade de
destaque, o polo comercial mais importante do reino, fruto de uma posição
geográfica privilegiada.
Lamego, um lugar onde se apuram todos os
sentidos.
Ex-Libris.
Escala o Monte de Santo Estêvão uma
imponente escadaria banhada por uma avenida de lagos habitados pelas quatro
estações do ano. Erguidas ao céu em zig-zag, as escadas arrecadam, nos seus 686
degraus, a musicalidade do martelo e cinzel que os canteiros imprimiam com todo
engenho e arte. Lavravam laboriosamente uma obra, do provável risco de Nicolau Nasoni
ou da inspiração do seu cunho artístico, tendo em comparação a fidelidade do
seu estilo.
A escadaria é travada por pátios ricamente
decorados e ladeados por um frondoso pulmão verde engordado por várias espécies
autóctones. Ao longo da caminhada, os peregrinos pousam o olhar de incentivo na
fé, em pátios como o de “Nossa senhora de Lurdes” com capela de porta coroada
por um brasão do bispo edificador, D. Manuel Vasconcelos. Em frente, a “Fonte
da Sereia” acoplada pela escultura de um tritão montado num golfinho. Noutros
patamares, a “Fonte de Pelicano”, a “Sagrada Família”… tudo lavrado na
sumptuosidade da pedra nortenha.
Próximo da Igreja, ergue-se destemido um
fantástico quadro escultórico, o “Pátio dos Réis”, habitado por dezoito
estátuas nos seus pedestais correspondentes aos réis bíblicos. Estes,
aproveitando os seus poderes, ordenam aos mouros que acartem toda a pedra
manualmente. Ergue-se no centro, como símbolo do trabalho, a admirável “Fonte
dos Gigantes” através de um obelisco que se eleva às alturas, uma verticalidade
suportada nos ombros de homens que jorram água pela boca. O pátio é ladeado por
pórticos do mais sublime encantamento. Todos os elementos combinam no gosto de
uma arquitectura sustentado pelo uso de colunas, frisos, frontões, arcos,
curvas, contra-curvas, capelas e nichos, sem esquecer os amistosos painéis de
azulejos azul e branco cuja temática revela episódios religiosos sublinhando,
mais uma vez, o Barroco em todo o seu esplendor.
O mesmo terreiro, no passado (séc. XIV),
foi geografia da “Ermida de Santo Estêvão” que, depois de demolida, dá lugar a
uma outra em honra da “Nª Sª dos Remédios” também demolida para mais tarde
erguer, num espaço estratégico, uma Igreja definitiva em honra da actual
Padroeira. Ao encimar a caminhada, o monumento encontra o seu ponto de fuga
coroado pelo actual Santuário num terreiro amplo e divino sublinhado pela imponente,
bela e requintada Cruz Monolítica. No mesmo recinto, ainda há lugar para uma
harmoniosa fonte com o risco de Nicolau Nasoni, esculpida sob o granito da
região e datada de 1738. A jóia de Lamego data o início da construção em 1777
dando-se por concluída já em pleno séc. XX. No entanto, o projecto soube
guardar, na sua imponência, o gosto requintado e rebuscado de um estilo que
afirma a existência do Barroco em Portugal.
27-08-2016
Lurdes Gomes
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