sexta-feira, 1 de maio de 2015

A casa encantada

Foto: josé alfredo almeida





"Não é a casa que nos abriga. Nós é que abrigamos a casa, pois é a ternura que sustenta o tecto."
                                                                                                            Mia Couto



Esta casa tem certamente uma história.
e o olhar de alguém quem sabe, poisado no rio, ou nos montes, ou apenas dentro de si.

Há dias que qualquer nada faz renascer tanta coisa, tantas e tantas emoções...
Um cheiro doce.
E o tempo pára.

E lá está o Avô sentado confortavelmente no seu cadeirão na varanda defronte para o rio, a pitar o seu cachimbo.
A olhar o rio,
a olhar o rio, ou a voar para lá do rio, para lá dos montes, até ao passado...
O cheiro doce do tabaco que ele tirava de uma caixinha de madeira e enchia o cachimbo sem pressa, como de um ritual se tratasse.

Na casa grande tudo era alvoroço.
A Mãe a levantar a mesa do almoço, a senhora que ia lá a casa ajudar, a começar a fazer a limpeza, as crianças a correram à volta da casa a entrarem, para dentro de casa, a esbarrarem com a mãe que tentava equilibrar nas mãos as travessas e os pratos..

E o olhar do Avô preso lá longe.
E uma das crianças sentada a olhar o Avô.
Amava aquela casa, cada membro da família.
Cada verão, cada estação.

Mesmo quando alguma coisa não estava bem, estava tudo bem.
A casa, aquela casa grande, com todo aquele espaço, as árvores,
a figueira generosa imensa e fresca, virada para o rio.
A casa com os seus odores, com a voz da Mãe, com a hora do estudo, no tempo de aulas e a tia a tomar conta.
A casa.
A casa encantada.

Até quando?
Até quando pode durar a eternidade…
Até quando Avô?
O cheiro doce do seu cachimbo,
o barulho das outras crianças...
A rotina tão segura de todos os dias.

A casa será sempre eterna.
Porque está viva.
Dentro daquela criança.
E em mim.

Ana de Melo

2 comentários:

  1. Conjugação "deliciosa": foto e texto.
    Uma casa rústica embutida numa paisagem verdejante, ainda com árvores despidas a que se junta outros sinais dos tempos...tinha que ter subjacente, uma história bonita como esta.
    A casa perdurará, mas o sonho, as doces lembranças nela vividas, também.
    Parabéns a ambos os autores.

    Paula Pedro

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  2. Estes são , momentos realmente , únicos..
    e maravilhosos !!!
    Obrigada aos , autores ...são fantásticos !!!

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