sábado, 13 de julho de 2019

Nem só de verde vive o Douro…

Foto:josé alfredo almeida



Azáleas vermelhas
por entre as pedras-
lágrimas de cuco

Matsuo Bashô





    Não há confusão possível. Não são de Minho, estas vinhas. Essas, de construção arquitectónica, formam ramadas densas, amparadas a casas ou a outros esteios, tomando a forma de caramanchões ou de pérgulas. Tão convencidas da sua aristocracia minhota que nem se lembram que estão enforcadas!…. Regalam-se com os encómios de quem lhes bebe as sombras, antes de lhes emborcar o vinho. Foge-lhes o pé para o tacão alto!

    No Douro, a morfologia do solo impõe uma organização mais modesta de cepas, tortas e direitas… São bardos baixos, quebra-costas de vindimadores, de “roubadores de ladrões”, de tantos quantos lhes satisfazem os caprichos de senhoras do vinho. São rés- do- chão de variável pé direito, erguem a vista para altos que de altos as miram. Convivem bem com a diferença. Têm os seus trunfos, o seu modus vivendi, os seus timings. Apostam na diferença. E quando as flores primaveris das altivas fruteiras puxam pelos seus galões e desatam a florescer ao desafio, elas, de floração tímida e infantil, despercebida à vista desarmada, riem para dento, remoendo: - não esperais pela demora! Porque as suas cores resplandecem no fim de ciclo, em folhas de desforra.

    Despedem-se da letargia invernal com lágrimas nos olhos, gotas de seiva saídas de pontas poupadas a podas prudentes.  Não é choro de luto, antes de emoção, por abrirem portas a um novo ciclo, já com renovos à bica, prontos para reverdecerem negros cascosos.

    E, atingida a maioridade, aí estão elas, as vinhas, encavalitadas, formando linhas onde espíritos poéticos podem ler versos de epopeia. Poesia são também as flores de arbustos, quietos e trepadores, que as coroam em espaços sobranceiros: glicínias, buganvílias, rododendros, acácias, cameleiras e outras graciosidades naturais, prontas a refrescar olhares viciados nas belas cores da vida. Nas fortes cores do Douro.
    

M. Hercília Agarez
Vila Real, 13 de Julho

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