Foto: Arquivo de josé alfredo almeida |
Este ano, 1966, foi ano de festas. Isto quer dizer que foi ano de barulho ensurdecedor. Belo
fogo de artifício, boas bandas de música, procissão regular… Mas, o
predomínio do altifalante sobre todos os números do programa? Fez fugir
almas sensíveis, fez-lhes tapar os ouvidos.
Com o advento da
sonorização mecânica, abusiva em mão de maus mecânicos, foram-se os
tempos áureos das festas do Socorro. Nesses belos tempos, não havia
zanguizarra que incomodasse, na execução de belos repertórios, famosas
bandas de música. O arraial do rio, hoje deserto, porque o forasteiro,
adepto do piqué, fica a ouvi-lo na alameda situada atrás da Câmara, foi,
nesses tempos, um festival deslumbrante. Aquém e além-Douro, duas
multidões irmanadas no prazer comum do Fogo e da Música… Rio abaixo e
rio acima, barcos iluminados e embandeirados… A bordo, gente alegre, que
misturava com as risadas corações de melancia, arroz de forno e anho
assado. Hoje, à luz dos foguetes, o areal de além-Douro é um pequeno
Sara. Do lado de cá, no antigo Passeio Alegre, hoje Avenida de João
Franco, há farrapos de multidão aborrecida.
Fizeram falta às festas
do Socorro as antigas touradas, cumpridas à portuguesa, sem
estilizações que pudessem indignar os entendidos. E a parada agrícola?
Todos os anos se realizava uma exposição de tudo quanto produz o solo
duriense. Vinhos, frutas e flores… Porque deixou de haver parada
agrícola? Era certame de valor real e espiritual. Juntavam-se aos
renovos, como enfeite, rendas e bordados. Compareciam linhos e damascos.
Ressuscitavam alfaias para luzir uma hora.
As festas do Socorro
degeneraram. São hoje uma embriaguês de ruídos, devida ao culto do
altifalante. Se o microfone, bem regulado, fosse privativo da autoridade
para uma urgência, é provável que as festas do Socorro tornassem a ser
harmoniosas.
João de Araújo Correia in Horas Mortas
Memórias de outros tempos.
ResponderEliminar"Compareciam linhos e damascos.Ressuscitavam
alfaias para luzir uma hora"